terça-feira, 21 de junho de 2016

Por terras de França II

Portugal e as dificuldades no jogo de criação

Frente à Áustria Fernando Santos em comparação com o jogo anterior retirou um médio, João Mário, e lançou um extremo, Quaresma, mas os problemas perante uma defesa recuada e compacta mantiveram-se.
Na partida de sábado enfrentando a postura expectante da Áustria que defendia com duas linhas de 4 no seu meio-campo, Portugal viu-se obrigado a assumir a posse de bola. Com Nani preferencialmente no meio, os extremos Ronaldo, à esquerda, e Quaresma à direita (ainda que pontualmente fossem trocando com Nani também a aparecer nos corredores laterais) começaram por dar largura ao ataque e a receber bola junto à linha lateral e à medida que o jogo avançava foram cada vez mais procurando espaços interiores, permitindo o adiantamento mais frequente dos laterais Vieirinha e Guerreiro. No meio-campo, a William Carvalho a dirigir jogo atrás juntava-se André Gomes mais pela esquerda, enquanto que, Moutinho à direita tinha tendência para progredir juntando-se aos jogadores da frente, acabando por arrastar marcação e permitindo que o central do seu lado, Pepe, tivesse espaço para avançar com bola e assumisse um papel de destaque na construção de jogo (aspecto em que não esteve feliz não conferindo fluidez à circulação somando perdas de bola). Na segunda parte foi André Gomes que se adiantou mais vezes à esquerda, permanecendo Moutinho recuado.
Pese embora, Portugal tenha feito o suficiente em termos de oportunidades de golo para vencer o jogo, continuam evidentes algumas dificuldades em criar perigo. Quaresma e Ronaldo quando iam para espaços interiores limitavam-se a jogar de costas para a baliza adversária e a devolver ao apoio frontal, dificilmente recebiam, ou procuravam receber, bola entre linhas recuando até à linha média austríaca tocando a bola para trás. O avanço de João Moutinho permitiu a Pepe espaço para construir mas também raramente conseguiu receber a bola no meio, dentro do bloco adversário, isto fez com que Portugal chegasse ao último terço essencialmente pelos corredores laterais, nomeadamente através de variações de corredor através de passes longos onde William Carvalho se destacou. Quando a bola se encontra nos jogadores de trás (médios e defesas) existe a preocupação de existir movimentos de aproximação ao portador da bola, mas o mesmo não acontece quando a bola entra entre linhas, sendo que quem recebe nessa zona só esporadicamente consegue fazê-lo de frente para a baliza adversária e continuar a progredir.
Desta forma, e para chegar perto da baliza austríaca a Portugal restou o bom envolvimento de Raphael Guerreiro pela esquerda e vários cruzamentos onde a selecção consegue colocar um número considerável de jogadores zona na área para finalizar mas os defesas adversários foram quase sempre mais fortes.

Nota final para a boa reacção à perda da bola. Portugal raramente permitiu contra-ataques adversários. Mérito dos médios que se encontravam atrás da linha da bola no momento da perda, ainda que João Moutinho e William Carvalho pela forma como escolheram o timming para pressionar, distinguindo as situações onde podiam desarmar ou simplesmente temporizar acção do adversário, mereçam especial destaque.

A evolução de Cristiano Ronaldo

Cristiano Ronaldo alcançou o estatuto de um dos melhores jogadores do mundo nos últimos anos essencialmente por aquilo que fazia (e faz) no último terço do campo. Partindo preferencialmente da esquerda é muito forte a definir próximo da baliza adversária, de trás para a frente, sendo que, aparecia mais do que estava em zonas de finalização e no corredor central. Nos últimos tempos cada vez mais Ronaldo é visto com maior frequência no meio, e no caso da selecção, em zonas até bastante recuadas. Sendo a evolução natural num jogador das suas características, Cristiano ainda parece longe da excelência nas suas novas funções. A pressão é feita com mais jogadores e o tempo para decidir escasseia, e terá de ajustar o perfil de decisão quando tem a bola, nomeadamente o timming em que a solta. Nem sempre equaciona o envolvimento com os colegas e força demasiado a finalização, não sendo nessa zona tão profícuo como uns metros mais à frente. 


(Texto originalmente publicado no Jornal Único)

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